28/07/09

Livros no Bolso - XI

Clarissa
Erico Veríssimo
Editorial Verbo, 1971

Depois de praticamente um mês ausente, o Livros no Bolso regressa hoje com um livro pelo qual nutro enorme carinho, um daqueles livros que vive para além das suas páginas e que nos acompanha mesmo quando habita a estante.

Clarissa, do escritor brasileiro Erico Veríssimo, traz-nos de mãos dadas sensibilidade e simplicidade, na história do crescimento da menina que dá nome ao livro e que é poesia e música ao mesmo tempo, expressão do futuro e prova delicada do milagre da vida.

Toda a narrativa se concentra no tempo de uma mudança de estação: dos pessegueiros em flor, aos pessegueiros de fruto maduro, período de transição de Clarissa, de menina moça nos seus treze anos, a mocinha feita, acabada de completar as catorze primaveras.

Natural de uma pequena cidade do interior, Clarissa vem estudar para Porto Alegre, a capital do estado de Rio Grande do Sul, ficando a viver na pensão de Tia Zina, mulher trabalhadora e austera, mas de coração brando e delicado.

Embora circunscrito à pensão e à escola, o universo de Clarissa é paradoxalmente amplo porque feito de sonho e ilusão. É justamente na pensão, entre os hóspedes de Tia Zina, que Clarissa vai descobrindo um mundo que não acaba, ao mesmo tempo que se apercebe das transformações do seu mundo interior, da transição do seu corpo, da ilusão do amor.

Como contraponto ao fascínio e ingenuidade de Clarissa, desfila pelo livro toda uma galeria de personagens, do insolente Nestor à mulata Belmira, da infiel Ondina, ao preguiçoso Tio Couto, com destaque para Tonico, a criança triste que perdera a mobilidade num acidente, e Amaro, homem da arte, introspectivo e melancólico, que vê em Clarissa a antítese daquilo em que se transformou a sua própria vida. É aliás pelo olhar deslumbrado de Amaro que Clarissa nos é dada a conhecer enquanto expressão da possibilidade infinita num mundo que, para ela, está ainda por explorar: «Amaro torna à janela. Clarissa mergulha na sombra do arvoredo, toda cheia de crivos de sol. Ergue os braços, põe-se na ponta dos pés, entesa o busto, pondo em relevo mais forte os seios que mal apontam. Segura com ambas as mãos o galho de um pessegueiro, dobra os joelhos e deixa o corpo cair num abandono gracioso. Os ramos se agitam, as flores se desprendem e tombam como uma chuva de pequenas borboletas rosadas. Olhos cerrados, cabeça inclinada para trás, Clarissa solta uma risada.»

Erico Veríssimo é um dos escritores brasileiros mais populares. Nascido no Rio Grande do Sul, em 1905, as suas obras revelam uma temática tipicamente brasileira numa escrita de estilo simples e depurado. Escrito em 1933, Clarissa foi o primeiro romance do autor.

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